Por que sua carteira emagreceu e o capital engordou: o custo de vida no Brasil

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Imagine acordar todo dia com a certeza de que seu café está mais caro que ontem — e seu salário, menor que anteontem. Se você sente que o bolso ficou slim enquanto o lucro dos de cima virou bodybuilder, parabéns: sua percepção está afiadíssima. Este artigo responde, sem rodeios, às perguntas que atormentam nossas contas e nossa sanidade, mas faz isso no estilo “Traidor da Classe”: sarcasmo, sem firulas e um leve cheiro de gasolina para ver o circo pegar fogo. Vamos lá.


1. A inflação não é bug : é ferramenta

Por que tudo está mais caro? Porque assim o sistema funciona. Após 30 anos do Plano Real, nosso real vale cerca de R$ 0,12 de 1994. A inflação brasileira persiste acima do centro da meta, alcançando 5,35% em 12 meses. Ela vem de vários lugares: energia elétrica (+16,8%), alimentos (+7,7%) e gasolina (+9,7%) em 2024–25 [1]. Há ainda o componente estrutural: as cadeias agroalimentares elevaram o IPAB em 282% de 2007 a 2024, contra 171% do IPCA [2]. E há o rentismo: Selic a 15% garante retorno gordo para quem vive de juros, não de salário.

2. O custo de vida só sobe porque salário não acompanha o preço

Mesmo com ganho real de 7,5% no salário mínimo em 2025 (R$ 1.518), o poder de compra segue estagnado ou em queda. Entre 2007 e 2024, alimentos no domicílio subiram 283% — seis refeições viraram três. E lembre-se: a distribuição do peso é desigual: classes D/E gastam mais de 30% da renda só em comida e transporte.

3. Gerações e o downgrade de estilo de vida

Millennials e Gen Z compram memórias on-line porque imóvel virou miragem. No Brasil, o salário médio real segue abaixo do nível de 2014, e a casa própria ficou a 15 anos de distância. Metade da Gen Z avalia suas finanças como “ruins” e 32% listam desemprego como preocupação nº 1.

Se os trabalhadores não virarem a mesa, você será a primeira geração em anos a ser mais pobre do que seus pais.

4. Psicologia do bolso furado

Não basta faltar dinheiro: sobra ansiedade. De acordo com Pesquisa Serasa-Opinion Box, 83% dos endividados sofrem insônia, 74% não conseguem se concentrar. A pressão financeira cria sintomas psico-fisiológicos — da gastrite ao burnout. Gastos médios com terapia já superam R$ 300/mês, mas plano de saúde subiu 7,9% em 2024 [3].

5. É projeto, não acidente

O aumento do custo de vida cumpre duas funções para a elite:

I) transfere renda via juros altos;

II) disciplina o trabalhador.

Não se esqueça: arrocho salarial na ditadura (1970s), PEC do Teto (2016) e Selic cronicamente alta. Enquanto você escolhe entre carne e aluguel, dividendos gordos mantêm acionistas em cruzeiro. Coincidência? Duvide.

Leia mais sobre o assunto (Reflexões Críticas): “É projeto, não acidente: quando o arrocho vira arquitetura de poder”

6. Quando o povo virou a mesa

Em 1917, uma Greve Geral exigiu jornada de 8 h e “redução do custo de vida”. Em 1953: Greve dos 300 mil arrancou 32% de aumento em plena inflação. No anos de 1978–80: Greves do ABC garantem 63% de reajuste e racham a ditadura. Já em 1978: Movimento do Custo de Vida leva 1,3 milhão de assinaturas à Praça da Sé contra a carestia. Há pouco tempo, em 2013, movimento Passe Livre estoura porque R$ 0,20 de tarifa extra foi a gota no oceano de insatisfação.

Manifestação dos metalúrgicos em greve contra intervenção no sindicato pelo TRT e pela polícia. São Bernardo do Campo, SP, 1979. Fotografia: Jesus Carlos/Em Tempo

7. O que fazer enquanto o circo ainda não pegou fogo

As 5 dicas do Manual do Traidor da Classe:

a) Organize-se: sindicato forte ainda é o remédio que faz patrão abrir planilha.
b) Lute por política de valorização permanente do salário mínimo.
c) Apoie taxação de lucros e dividendos para subsidiar alimentos e transporte.
d) Compre conscientemente, mas jamais compre o discurso de que “inflação é culpa do pobre que consome”.
e) Educação financeira anticapitalista: 10% para você, 10% para a greve, 80% para sobreviver — até invertermos essa lógica.

Conclusão

Quem disse que não há saída esqueceu de ler a história. Toda vez que a carestia passou do ponto, houve greve, panela vazia e abaixo-assinado. Se o aumento do custo de vida é projeto, nossa resistência também tem de ser. O Traidor da Classe já acendeu o fósforo; falta a gasolina coletiva.

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